No coração do Raval, na Rua Tallers 45, hoje é prestada uma homenagem a Roberto Bolaño num espaço que reúne bar, biblioteca, exposições e concertosNo mesmo local que antes era um pequeno sótão, o escritor relata a ligação de quinta-feira, 19 de outubro, Mats Malm, Secretário Permanente da Academia Sueca, que anunciou a prêmio Nobel de Literatura.
Com tom sereno, Bolaño evita a grandiloquência: sublinha que os prémios passam e a literatura fica, e que sua alegria É acima de tudo prático, de alguém que competiu a vida toda. Em sua ironia inconfundível, ele admite que o Prêmio Nobel encerra sua “rota da falência” e que ele não irá recorrer a mais ninguém.
Reações e opiniões sobre o Prêmio Nobel
Bolaño aborda com humor a questão da sensação de vencer, comparando-a aos clichês do futebol, e qualifica o peso do prêmio na tradição espanhola: ele cita Cervantes, Quevedo e Borges para nos lembrar que o mapa da língua nem sempre coincide com o dos prêmios. Sem triunfalismo, ele insiste que a posteridade é uma questão incerta e que seu compromisso permanece com o trabalho e leitores.
Influências, disputas e cânone pessoal
O autor relembra seus anos infrarrealistas no México, quando boicotaram Octavio Paz, e agora reconhece o valor de sua poesia e ensaios. Ele se define poeta popular e celebra que algumas das melhores poesias do século XX foram escritas em prosa de grande fôlego (Proust, Joyce, Faulkner). Entre os que abrem o caminho, cita Juan Villoro, Rodrigo Rey Rosa, Carmen Boullosa, César Aira, Enrique Vila-Matas, Fernando Vallejo, Rodrigo Fresán e Javier Marías; e, francamente, critica certos autores. “escritores sem ritmo” aqueles que são colocados no lado oposto.
Do papel para a tela: cinema e música
O recente lançamento de Os detetives selvagens Em Hollywood, ele está em evidência. Timothée Chalamet interpreta seu alter ego, Arturo Belano, e Anthony Ramos interpreta Ulises Lima. Bolaño destaca uma trilha sonora com Bob Dylan e Patti Smith e lembra com carinho de Mario Santiago lendo até no chuveiro. Sobre o elenco, ele destaca o sucesso de Javier Bardem como Octavio Paz e ressalta que o essencial é retratar jovens que apostam tudo na poesia.

Séries e novos projetos
em 2666, o autor confirma o interesse em transformá-lo em série e estabelece uma condição fundamental: respeitar a estrutura de cinco partes, o que se traduziria em cinco temporadas. Lembre-se do papel de Anagrama em sua publicação e menciona carinhosamente Jorge Herralde. Ao mesmo tempo, anuncia que está preparando um nova coleção de poemas que ele planeja entregar a Sandra Ollo.
Profissões, leituras e ética do leitor
Bolaño relembra seu passado: abandonou o ensino médio aos 18 anos Anos 16 ler e escrever incansavelmente, e trabalhou como garçom, vendedor de ingressos e segurança em um acampamento. Ele confessa que até roubar livros quando jovem e que o abandonou quando foi apanhado; ele argumenta que a pirataria é uma sintoma ambíguo de interesse em uma obra, mesmo que isso incomode a indústria, e mantém seu compromisso com a leitor atento.
Geografias literárias: Raval, Barcelona e Blanes
Em sua imaginação aparece o Barcelona alternativa dos anos 70, um viveiro de vozes latino-americanas que aparecem em livros como Cidade central. Mas está em Blanes onde o seu quotidiano, longe dos holofotes e dos roteiros turísticos, se torna decisivo: entre compras, conversas com amigos e uma saúde frágil, foi criando romances como Os detetives selvagens, amuleto y 2666 em um pequeno apartamento à beira-mar.
O verdadeiro horror por trás da ficção: o caso Abarzúa
A intersecção com a história chilena permeia sua obra. O perfil de Patricio Abarzúa Cáceres, conhecido de Bolaño desde os tempos de escola em Los Angeles e que se tornou um agente repressivo após o golpe, inspirou o poeta-assassino Carlos Wieder en Estrela distanteSegundo os autos do tribunal, Abarzúa participou em detenções e torturas, tinha ligações a agências de inteligência e, já em democracia, foi condenado por narcotráficoEle faleceu em 2019, deixando um rastro que nos lembra como o monstro pode emergir da vizinho do lado.
Principais obras e legado
Considerado uma das vozes mais influentes da língua espanhola, Bolaño criou um projeto narrativo que se cristalizou em Os detetives selvagens y 2666, romances de ambição formal e épica que consolidou seu prestígio crítico e lhe rendeu prêmios decisivos. Com o Prêmio Nobel, seu nome se firma ainda mais nesse panteão da literatura que ele próprio prefere olhar de longe.
Suas obras, caracterizadas por uma estrutura complexa e personagens memoráveis, deixam um legado que transcende a moda. Paciência e lucidez em seus textos são fundamentais para seu estilo, e seu relacionamento com os leitores permanece forte.